quinta-feira, 29 de setembro de 2011

ELA DORME (de Marcos Salvatore)

by Michael Dweck


o que está feito
está feito

e agora
ela dorme


agarrada à clave de sol
tatuada no meu peito

meu leite ainda

escorre em sua boca


abre inteiro caminho
de memória
até o bico do seio direito



também nosso suor
nossa saliva viva

colorida, espalhada pelo chão
depois de tanta força

desse jeito

dedos pensativos
(...)
enrolados nos meus pelos
(...)
exaustos

terça-feira, 27 de setembro de 2011

SERENO (de Marcos Salvatore)




Dá vontade de ser
O que eu escrevo

De ir além do ponderável

Sem medo do sereno,
Sem segredos ou escamas

Um pisciano,
Ou apenas um sujeito da cidade

Um vulnerável
Às três da madrugada
Ao passar com tanta pressa
Pelas ruas de Belém.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

IMUNE (de Marcos Salvatore)

by Utrello


Paira acima de tudo:

Feitiço criado, plantado e colhido em sua terra.
Em minha água fervido, filtrado... bebido

Não lembro de como eu era
Ao sentir suas gírias
seus eufemismos baratos
Me cobrindo aos seus cabelos modulados
 
Sem dó, nem piedade
Penso apenas: “eu não era, agora sou”

E te alimentar
Com as dobras de fraseado
Da poesia diagonal
Anti-aérea

Que escorre da minha língua “ophidia”
Que se infiltra, reticente
E se dissolve em sua boca
Me cala fundo
 
Te ouvir me decifrar
Me assimilar

Improvisar do nosso amor
Acorde por acorde
A cada dia, a cada noite

Uma nova melodia
Não transcrita
Imune à arte de dizer adeus

É do caralho

terça-feira, 20 de setembro de 2011

DELIRIUM TREMENS (de Marcos Salvatore)

by Irving Penn


Uma lágrima cai sobre o papel
Umedecendo a tinta das palavras

“Não se perca dos seus pés
Ao voar sobre as mangueiras”

Dentro das contradições dessa cidade
Pode-se encontrar o amor
Uma esperança, uma maneira

Da surdina inespecífica
À própria voz
Até que as notas do seu corpo vibrem no final

Tempero espontâneo
De pessoa feliz com sua metade
Traço vigoroso
Escondido na bagagem

Escondido nos espaços
De uma frase

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

PEIXES (de Marcos Salvatore)

by Jacques Henri Lartigue

Sua fantasia está comigo
Imaginativa e sensível
Bordada de alegria, de orgia, de empatia e compaixão
Venha buscar que eu já estou saindo fora (como sempre, colado)

Vou ser feliz, não sei se volto.
Estou de boa, te esperando pra valer com os demais amigos.

Que bom, que bom.

Atrás de tempestade e um copo d’água... de um cigarro
Jeans surrado, camiseta furada, tênis do ano passado
Gosto do mistério e do ridículo, matéria prima de perder-se
Sem carnaval, sem árvore de natal; melhoria total

Faço a sua corte como um puto sem lar e sem par
Antes, durante e depois de cada vendaval
Enquanto tudo pinta lá fora (eu sou assim)
Queria ter te encontrado antes, muitos anos atrás

É que uma coisa sua transa, brinda, anda comigo
Dança e canta, me confunde, me dá nexo, teto, abrigo (trigo pro pão)
Exposta e oposta ao sol e a lua nua, quando me escreve
Uma nota especial, cheia de espaços e acordes pra tocar na pele

Corra que aqui está tudo ok, e a coleta já rolou pro rock’n’roll
Que a turma toda se deu bem e esperam só por nós pra clarear
E a realidade é o limite, é um presente, eu já sei, ta tudo aí
E a vida pode mesmo ser longa, meu bem (sem dó nem “faz de conta”)

Senhorita chuva lá fora me molha e me repara noutro lugar
Toma conta de mim enquanto você não aparece
Pra gente se exigir discretamente
Aguarda que o seu coração, sem pensar, entre na minha, dê um sacode geral
E venha me buscar nem que seja lá na casa do caralho

Toque o terror, bata na trave, me desatine, me anime até sangrar o alho
Coloque a rima que me falta para não te machucar

Minha batata, se assou, foi por amor, foi por acaso (alma perdida, escorregadia)
Levou um samba do sorriso que você me deu... naquela noite (...)
Sua simpatia de tato me fez responder com calma e paciência

E eu quase não me controlei.

Nunca sei como agir, como falar,
Como te olhar sem beijar, sem abraçar
(tenho medo de você também me amar)
Troco as letras, as idéias da canção que eu não te dei

Que está onde está:
Livre.


terça-feira, 13 de setembro de 2011

IDENTIDADE (de Marcos Salvatore)

Não sou muito de torrar as "paciência", muito menos de falar "cas parede", mas queria desabafar uma coisa: Para se conseguir uma 2ª via de identidade nessa porra, é necessário ir para uma fila do caralho, às duas da manhã e esperar que ÀS 08:30, um FILHO DO PESTE apareça para distribuir 30 SENHAS, que serão atendidas no máximo até as 10:00, e ninguém te atende mais depois disso, nem a tiro, nem a pau, nem por decreto, se Jesus aparecesse depois do horário, não tenham dúvida de que teria que voltar na madrugada seguinte. E é absurdo dizer que isso é um absurdo! Ficam lá com o dedo enfiado no cu, assistindo TV. E fico EU, como indigente, um "mato-fino" sem RG, que nem um filho da puta. Se me pegarem porre pela rua, gritando "coisas cruéis", ou dando em cima da mulher do próximo, sei lá, dando uns "coelho" com uma moça de família qualquer, vai ser porrada e cadeia na certa. Tudo porque eu me recuso a ficar a madrugada inteira, ao relento, esperando por uma merda de uma senha. A madrugada é feita pra fazer amor, meu senhor, meu irmão! Mesmo que eu broxe depois da quarta ou da quinta, não importa. Também não vou pagar propina pra furar fila nenhuma, nem vou puxar o saco seja de quem for. Quero apenas entrar naquela porra, NO HORÁRIO DE ATENDIMENTO, pegar a fila comum, não me importa o tamanho, pagar a taxa que for e sair de lá com o meu crachá de brasileiro.
Antes de mudar esse país é preciso exterminar os "GALA-SECA" de ambos os sexos, os "CU DE BURRO do QI".
MORTE AOS PARASITAS!
E Viva a Brôa de milho, a cachaça, o tucunaré, Gonzagão e Patatita do Assaré.

domingo, 11 de setembro de 2011

GONORRÉIA VOCAL 2001 – 2012 (de Marcos Salvatore e Carlos Solaris)

by Jan Saudek

Letra: Marcos Salvatore
Música: Carlos Solaris

A banda Mal Nenhum era composta por insanos, vagabundos e famintos. Mesmo depois de 10 anos, olho essa música e não consigo deixar de sentir a mesma arrogância e vulgaridade desconfortáveis da época em que tocávamos pelos pontos de ônibus da BR 316. A fita cassete (hoje perdida) gravada na minha cozinha contava com quatro canções: Br 316, Gonorréia Vocal, Interlúdio e a minha preferida: Blues do fim da tarde. (minha ex mulher tentou me matar dois dias antes) Todas compostas sob o furor de uma indigestão amorosa de macarrão com sardinha e taças e taças de vinho barato. As letras de temática perversa, masoquista, as melodias distorcidas pelos violões de cordas sujas e minha voz ainda forte, segura de sua desafinação, ainda não massacrada por noites e noites de sórdidas madrugadas, mostravam claramente o quanto eu andava ferido, indignado e chocado. As canções viraram mito, lenda. Ninguém sabe o que aconteceu com elas, mas continuam sendo tocadas por aí, em algum lugar empoeirado, mal iluminado e fedido. Gosto de pensar que mudamos para melhor, mas até onde sei continuamos meio insanos, vagabundos e famintos. Ave Carlos Solaris, onde ele estiver.


Eu quero arregaçar
de esquina em esquina
Tentando me acertar
Com a pessoa errada, uma mina

Imatura, fútil, mal passada
Me enchendo o saco com um monte palavras
Que eu cansei de ouvir
De sentir, de repetir

Eu quero o meu sossego
Grana, um amigo, um emprego
Pra valorizar sem exagero
Convite pro fim da festa

Soltando meu confete em todas as brechas
Entornando álcool, anticomprimidos
Sem sentidos semidepressivos

Isso nunca vai acabar, você tentou me matar
Não vou te ferir, não vou te machucar
Não sei lidar com isso, por isso
Vou cair na farra antes do bode chegar.

Bem, agora eu já me decidi
O melhor é sair por aí
Você não sabe quem é,
Você não sabe de mim

Mas fazer o quê se terminou tudo assim?
Se aquele lance acabou, teve fim?
Se o nosso amor nos deixou, nos passou
Uma gonorreia vocal?

GONORREIA VOCAL!
GONORREIA VOCAL!
GONORREIA VOCAL!

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

BAR INFERNO (de Marcos Salvatore)

by Jan Saudek


Volto,
Chega o meu misto,
Como devagar por estar quente.

Olho pro balcão ao lado,
e algo se parece com um copo de bebida.

Princesa se senta. Garota Down.
Não deixo de pensar:
- “É você quem vai pra casa comigo, Baby?”

É tudo coisa de gosto:

Coisas juntas,
Porres juntos,
Canetas juntas,
Ressacas juntas.

Juncos separados. Um todo de tudo tipo. Não posso conter.
Não quero me prender à espera de alguém que se repete, sem pista.
Mesmo assim, me prendo. Pode crer.

E escrito na parede do banheiro estava:
“Venha, venha assim mesmo.
Me deixe morrer de morte merecida: suicida, homicida”.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

CONJUGAL (de Marcos Salvatore)


Chegamos

Não tô aqui pra te entender
Você vai ver

Só vim por sua voz
ao som de um corpo inteiro

Só vim pelo prazer
Você também, que eu sei

Depois o meu
O seu primeiro

Pra te amar ao mesmo tempo
em que aprendo a fazer isso

Depois a gente mente
Sem embrulho, nove horas
Sem desperdício

Finge ciúmes, diferenças

Vai dar fome, você sabe
Antes disso a gente bebe, come, se consome

Pratos, copos e talheres
Sem compromisso de durar pra sempre

Sem essa, sem aquela
Segundas, quartas e sextas
No banho, na cama, na mesa

Não faz assim que eu não consigo respirar
Assim não sobra espaço
onde eu também possa me amar

Tira isso, põe aquilo
Que sobrou a mim pra conjugar
E a tendência é de mudança
A intenção é variar na violação e na dança

Parecido criança como quando era com a gente
E procurava, descobria, escondia, ria
Lugar qualquer pra se esconder, para chorar

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

ALIMENTAR (de Marcos Salvatore)



me atrapalhei com as palavras
que você me deu na boca
as migalhas
tua comida nobre
abrigo rudimentar
da novela sem limite que me causou
me semeou
me captou o final
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