segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Sanatório Enluarado (de Marcos Salvatore)

by Les Krims

Dia: - fatalidades

Lá fora é bom
Pela janela

Noite: - surpresas

Secando os cabelos
na mesma toalha
improvisada de travesseiro

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

HÁLITO (de Marcos Salvatore)

by Guido Crepax

Querida Clarice,
 
Crise!
Não leve tão à sério esses pequenos traumas. Também sinto a sua falta, e você sempre foi uma ótima amiga, sempre. Até pensei que era mais, por falta de não sabermos o que fazer com aquilo. Mil coisas assim. Uma puta saudade da sua risada lolita, desse seu corpinho imaginário, do seu bumbum durinho e mulato. Enfim, depois de um período bacante de masturbação existencial e contemplação estática, eu continuo aqui, com a "Legião" na vitrola, minha taça de vinho tinto "sangre de Dio" sobre o criado mudo, Ana C., Álvaro de Campos, Manuel de Barros me cobrando um xeque mate. Nelson Rodrigues em pó, para misturar com a batida de Tatuzinho com morangos, catuaba, cravinho e gengibre, bons para a libidinagem do hálito. O fato é que tardiamente assumo que eu te amava além dos boquetes via créditos promocionais. Você nem percebeu. Só chamo a Angela pra você que é sonsa e que morre na beira! Então, se já estiver boazinha comigo, vê se tira o celular do rabo e me liga logo de uma vez. Senão, tola é você, por não ser do jeito que eu não sou.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

LUZ DO DIA (de Marcos Salvatore)

by Henri Cartier-Bresson

Boa noite. E enquanto isso, alguém que não voltou pra casa, perambula pelas ruas de Belém. Caminha devagar, dobra esquinas reconhecidas pela lembrança da luz do dia, se abraça, fugindo do frio e deixa, sem pensar, a boca sussurrar: - “Fica”.


terça-feira, 18 de outubro de 2011

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

LIBRA (de Marcos Salvatore)

by Victor Brecheret




consegue ouvir?
é um som vindo dali, de acolá.
um rompante sonoro de pessoa amada
além de um coração forte e em paz

cheio de alegria convencional e suave
navegação serena, equilibrada
desprovida de provas vazias
mensuradas, presumíveis

querendo a chance de dizer, de falar
desatinada pela viagem perdida
pela falta de alguém

- gosto de te provocar,
de te arregaçar os braços
na marra, por causa do orgulho
de manipular tua vontade, tua sagacidade

tua prata, teu ouro
tua flexibilidade moral
do absurdo

é quando menos se espera
pela ânsia
de não se ter mais paciência

- espera! eu fico com isso,
me serve,
me dá
me acomoda nesse incômodo de estar fora d’água

enquanto te ensino e te aprendo
portanto, não fuja
agora, chega de pensar e pensar
de me analisar

não adianta

não vê que assim pode se machucar?
e me forçar a te dar mais esperança
deve ser por isso que estamos aqui
se você quer saber

recicle-se este punho fechado
pulsador de amores, de saudosismos perenes
arrastando correntes de dia e de noite
toda sorte de odores lembrar, dele coração partido

que um dia
procurou por você de bar em bar
quase enlouquecendo por isso
fornicando com as palavras sem parar

é aquele mesmo bombeador da perversão
que usou comigo de alucinações, débitos e créditos
forçou-me ao êxodo voluntário da carne e do sangue
à promiscuidade bacante, embaralhado respirar

quase fazendo coisas
que não se menosprezam

questionáveis

mala cheia de sonhos
um destino destinado, astrologicamente dopado

mas nem tudo eu temo em contraste
quanto mais? ainda sinto, ainda posso.
nem vírgulas, nem pontos, só exclamações costuradas à mão
apenas a vil correção das estrelas

parabéns nesta data,
meu amor
minha libra de justas intenções
de peso equivalente

à força da minha boca contra a sua boca

que não me acredita
ou se rende
nem quando me jogo
do décimo andar

então para de chorar, chega de novela
deixa o que passou passar depois da ressaca
todo encanto é difícil de não se intimidar
então se atiça pro futuro que se sente

é um calor adjacente que retorna
muito à fim de se vingar

sei do quanto me quer e me gosta
mesmo sendo esses dois, dentro de nós
tão diferentes

como ondas do mar
contra as rochas

escreva com as unhas aqui
a meio caminho dos mamilos,
no meu peito exposto
a esse amor fraturado

escreva:
“me ligue amanhã,
às três da manhã
a qualquer hora
me ajude a nunca mais te procurar”

mentira!
vai estar sempre ao meu encontro
ansiosa por meditar sobre a insanidade e a razão
da minha língua contra o seu gatilho

enquanto me seca o cabelo suado

e eu falo demais, admito
e quase tudo pode durar
pode ser longo e conquistar
quase

quase pra mim
quase você

terça-feira, 4 de outubro de 2011

PRINCÍPIO ATIVO (de Marcos Salvatore)

by Thomas Karsten



O dia lá fora está tão
Virtual

Dá vontade de sair
Dobrando esquinas
Perguntando horas
Exclamando “que calor”, “que dia”, “que tempo”

Que tempo pra isso?
Em que tempo vivemos?

Esperando por alguém
Para atravessar a rua.

 

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

bombordo [ou livre para ler com uma mão só] (de marcos salvatore)

by http://thethoughtexperiment.wordpress.com/


bêbado. completamente besta. acordo no chão da sala com esses escritos me cobrindo o corpo. entre um sábado e um domingo. repetindo chet baker, nina simone, portishead. sei do que se trata, mas resolvi publicar tudo como estava.

ando deprimido
busco o amor dentro de cada palavra,
nos rótulos das garrafas
solos de baixo sem escala, aeroporto pra pousar
não me recuso a pagar o preço da vida
mas a vida tem que aceitar o fato
de que vai ter que ser a prazo... e sem entrada,
nem fiador,
nem garantias,
nem telefones de contato
desde então
meu coração é um vinil riscado
por agulhas usadas
violino de uma corda só
sofro de doença primária, crônica, progressiva e fatal
está tudo aqui, não lá fora. anestesia geral.
dentro de mim tem um animal em profunda hibernação
mas não quero matar a pessoa errada.
- me apeguei aos pregos das asas machucando minhas costas.
seria estupidez
mas, em todo caso
- me traz mais uma música, on the rocks
mesmo sabendo que o mundo não precisa de mais ninhos
também existe o círio; festa pagã
- não há evidência de milagre nessa época
com seu espetáculo de fé do povo
            - o amor perde feio pro sexo.
viva o povo brasileiro
viva a foda laica
prostíbulos lotados,
bares enchidos,
altos índices de violência e criminalidade
lembro da corda
do frio da manhã
somos noivos de outubro
nesse eterna despedida de solteiro
o derrame de baba vaginal é um sinal de dias melhores
dias inteiros
olho pra baixo e encorajo mais um vôo
é claro, arranho um violão, depois tento de novo
canto trancado no quarto, com o volume
no volume máximo
claramente sem sabor
apaziguo a tristeza com masturbação consciente
dou em cima de qualquer mulher de olhar desafiador,
onisciência, terceiro olho em sua testa
em suas tetas, sua buceta
depois digo, na maior: “não me tente”
também venho consumindo enlatados de segunda mão
calçados e roupas usadas
pão com mortadela, pratos de arroz com feijão
não dispenso um vinhozinho barato
(cinco e cinquenta a garrafa)
economia
nem me sentir como um animal
- diz que me ama, me arruma uns trocados
- faz de mim um samba de terreiro de vila
- me dá café na cama
- despois senta a porrada
“me dá pastel.
te pago aqui.
essa fome me deixa quase morto”
cheguei tarde,
perdi a chance de me atrasar
e a palavra aconteceu sem permissão
algo em você que me calou
consegue adivinhar o que seja?
depois diz que me ama
olha só
me amarra cordas nos braços, nas mãos
depois as pernas
depois sai por aí de praça em praça
me apresentando de graça
quer me cortar as asas
quer me comer de garfo e faca
costumes, poesia-pé-na-estrada
melhor parar agora
antes que eu te leve a sério
e comece a me encontrar em outro lugar
percebeu?
não?
ou quer que eu explique?
então esquece.
e termine de me ler agora
ou então me ame logo de uma vez
rasgue o que escrevi em mil pedaços
faça chover papel picado
que eu estou com pressa de ir embora
de mãos dadas com suas mãos
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